Mulher pode ser a mentora de sequestro de empresário paulista; suspeita tem vida misteriosa

“Tinha suspirado, tinha beijado o papel devotamente. Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades”. Um trecho de “O primo Basílio”, de Eça de Queiroz, sublinha a foto de uma jovem de cabelos longos, olhos negros, sorriso perfeito, numa rede social de compartilhamento de fotos. Leanny, de 25 anos, não era muito diferente de outras de sua idade. Selfies, viagens, fotos com animais e crianças, declarações de amor eterno aos amigos e ao namorado, Nilton, celebrações à vida.

Desde domingo de madrugada, ela está presa e pode ser a mente por trás do sequestro, em Jacarepaguá, de um empresário de São Paulo e seu filho, que visitavam o Rio. Um crime que teria planejado com a ajuda do irmão, que morava na Vila do João, uma das mais perigosas favelas do Complexo da Maré, e foi morto, com um comparsa, numa troca de tiros com a polícia. Leanny e o namorado Nilton estão no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, informa o Extra.

Agora, a polícia puxa o fio de meada para entender o desfecho da história. E tudo passa pela misteriosa vida de Leanny, que podia ter uma rotina dupla. O que se sabe, até agora, é que ela conheceu Nilton há cerca de um ano, quando ele, com 180 quilos, lutava contra a obesidade mórbida. Os amigos do casal não acreditavam no romance. Muitos achavam que Leanny só queria tirar proveito próprio da relação. Nilton Alves Moreira Júnior, de 24 anos, é rapaz de classe média alta, filho de um ex-engenheiro da Cedae. A família tem casa em Fort Lauderdale, na Flórida. Meses depois de uma cirurgia bariátrica, ele perdeu peso, ganhou forma esguia e muitos acreditavam que Leanny seria o motivo de tamanha transformação. Em fotos, é possível ver como Nilton mudou em pouco tempo. E também sua visível felicidade e devoção pela morena de corpo escultural.

Ao mesmo tempo, Leanny, que segundo amigos tinha origem humilde, não parava de viajar. Eles contam ainda que ela desaparecia alguns dias, ficando inacessível até mesmo por celular. Quando voltava, alegava sofrer de uma síndrome rara que a obrigava a se isolar. Não se sabe de onde obtinha dinheiro para as muitas viagens. Este ano, esteve em Búzios, Curitiba, Disney, Miami e Hollywood. No ano passado, passou pelo hotel de luxo Nadai & Spa, em Foz do Iguaçu, e pelo Hotel Villa Fraulo, em Ravello, com vista estonteante para a Baía de Salermo, no Sul da Itália.

PLANO TEVE INÍCIO EM SÃO PAULO

Nesta segunda-feira, Alexis Beghini de Carvalho, 27 anos, que foi sequestrado com o pai, José Alexis Beghini de Carvalho, 59 anos, conta que era amigo de Nilton, mas que ele andava estranho ultimamente. Alexis diz que o rapaz morou em São Paulo e que tinham se afastado quando ele veio para o Rio. Recentemente, Nilton foi com Leanny visitá-lo e, durante a viagem, ficou o convite para um novo encontro. No Rio. Descobriu-se, agora, que o irmão de Leanny, Leonny Luís Renones — morto no confronto com a polícia e sepultado ontem no Cemitério do Caju — também teria ido a São Paulo na ocasião, mas ele não foi visto pela família Beghini de Carvalho. Os policiais que investigam o caso acreditam que ele tenha ido para iniciar o levantamento e planejar a emboscada, que aconteceria no Rio.

Alexis — em 2009, ele viveu situação traumática semelhante, vítima de um sequestro que o manteve 49 dias em cativeiro — diz que o amigo se esquivava quando ele tentava saber mais sobre a jovem. Sua percepção era que Leanny Taceane da Conceição Renones era muito educada. Outra informação era de que moraria com uma amiga, na Freguesia, em Jacarepaguá.

— O trabalho de Leanny era uma incógnita para todo mundo. Ela dizia que trabalhava, mas vivia viajando com Nilton. Nós, os amigos mais próximos dele, estávamos sempre perguntando o que ela fazia da vida, mas ele sempre fugia do assunto. Dizíamos para ele abrir o olho, que ela só queria o dinheiro dele. Ela vivia aparecendo com presentes que ele dava — recorda-se Alexis, que menciona o comportamento estranho de Nilton ao voltar de uma viagem com Leanny a Foz do Iguaçu, em novembro do ano passado. — Ele me pediu emprestado R$ 5 mil. Fez o mesmo com outro amigo em comum. Disse que o pai estava viajando e precisava do dinheiro para resolver um problema, sem dar mais detalhes.

Alexis, a mulher e o pai tinham seguido de Land Rover para um jantar com Niton e Leanny num restaurante em Jacarepaguá. A noite foi divertida, Leanny registrou o momento numa selfie em que todos aparecem animados na mesa, devidamente postada em redes sociais. Na saída, por volta das 19h, depois de se despedirem do casal, os Beghini embarcaram no carro para voltar à casa da avó, onde estavam hospedados, também na Freguesia. Mas foram rendidos por dois bandidos — Leonny e um cúmplice. Os criminosos, provavelmente para dar veracidade à trama, também renderam Leanny e Nilton.

Todos foram colocados dentro do carro, sob ameaça de que só seriam libertados mediante o pagamento de R$ 300 mil. Quando chegaram ao Santo Cristo, policiais do Batalhão de Choque, desconfiados, abordaram o veículo e trocaram tiros com os sequestradores, que foram baleados e morreram no hospital. Leanny, a partir daí, entrou em desespero. Repetia que não havia necessidade de ter matado os dois, eram “vidas humanas que tinham se perdido”. Na delegacia, a certeza: os nomes Leonny e Leanny revelou o parentesco. O sobrenome confirmou. Para não restar dúvidas, a mãe dos irmãos ligou para o celular de Leonny, que tinha sido apreendido e estava na delegacia.

— Eu fiquei com pena da mãe, dava para ver que era uma pessoa honesta. Ficou em choque ao saber de tudo que aconteceu — diz o delegado Marcelo Carregosa, da 5ª DP (Centro).

O corpo de Leonny foi sepultado ontem. Cerca de 50 pessoas participaram da cerimônia. A mãe do rapaz esteve presente, mas não quis comentar o caso. Amigos estavam muito emocionados e vestiam blusas pretas com a foto do rapaz e a frase “O brilho nos olhos e o jeitão de criança deixarão saudades”.

Um ex-namorado de Leanny disse ontem ter ficado chocado. Ele namorou a jovem há cerca de três anos. Foi por um curto período. Ele, assim como Nilton, a conheceu numa boate. La Passion, na Glória, ,onde seria promoter. Ele ficou estarrecido com a suspeita sobre a moça:

— Deus do céu. Estou horrorizado.

EMPRESÁRIO JÁ FOI SEQUESTRADO

Vítima da violência duas vezes, esta última pelas mãos de um amigo, Alexis afirmou ontem ao GLOBO estar inconformado. De acordo com o empresário, Leanny teria dito, em depoimento, que era garota de programa e seria sustentada por um homem mais velho. A polícia não confirmou a informação.

— Pensei que nunca mais fosse viver momentos tão aterrorizantes como aqueles. Meu sentimento é de revolta por ter sido enganado. Mas vou me tranquilizar porque tenho certeza de que eles vão ficar presos por um bom tempo. Quero que ele (o amigo) pense no motivo de ter feito aquilo. E, quanto à ela, quero que passe muito tempo na cadeia — desabafou, observando que ele e Nilton, ambos engenheiros civis, eram aficionados por carros e se conheceram há cerca de três anos, numa festa em Penedo, no Sul do Estado.

O pai, José Alexis Beghini de Carvalho, fez aniversário ontem e comemorou com a família. Na volta do Rio para São Paulo, parou com a família em Aparecida do Norte, onde rezaram pela nova chance, o fato de terem nascido de novo.

— Certamente, o alvo era meu filho. O Nilton apareceu na casa de minha mãe e o chamou para tomar um chope no Bar Resenha, na Freguesia. Eu ouvi, disse que também gostaria de ir e me convidei. Ficamos até cerca de 19h, quando saímos do bar para jantarmos em família na Barra da Tijuca. Não antes de Leanny, com toda aquela hipocrisia, tirar uma selfie de todos nós. Nos despedimos. Eu, meu filho e minha nora fomos para o meu carro. O casal foi para o Peugeot do Nilton. Quando abrimos as portas, um homem armado nos rendeu dizendo “perdeu, perdeu, entrem no carro”— lembra José Alexis. — Foram cinco pessoas atrás. Meu filho, com mais de 1,80m, foi no meu colo. Ao meu lado, a namorada do Alexis com Leanny em seu colo. Ao lado delas, um bandido armado. Na frente, Nilton ao volante e outro bandido armado no banco do carona. Mandaram seguir para a Linha Amarela. A todo instante, o que estava na frente dava tapas no rosto e na cabeça do meu filho. Nos ameaçavam de morte.

O carro parou na Rua Pedro Alves, no Santo Cristo, onde aconteceu o confronto com a polícia. O irmão de Leanny e o cúmplice morrem no Hospital Souza Aguiar. Leanny e Nilton foram indiciados por extorsão mediante sequestro. Mas a batalha judicial está só começando. José Alexis vai recorrer para agravar a acusação.

— Quero justiça. Sofremos muito. Quero que sejam indiciados por formação de quadrilha.

Na internet, Leanny pouco revela de quem é de verdade, mas usa uma frase para resumir seu perfil: “Os contidos que me perdoem, mas eu nasci para ser intensa”.

29/08/2017

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