Temer pede pressa na suspensão do sigilo das delações da Odebrecht

Em entrevista exclusiva ao GLOBO, presidente fala sobre citação de seu nome em depoimento de executivo da empreiteira

Se dependesse do presidente Michel Temer, o ministro Edson Fachin, novo relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), suspenderia o mais breve possível o sigilo em torno das delações dos 77 executivos da construtora Odebrecht. Fachin substituiu o colega Teori Zavascki, morto em um desastre de avião em Paraty, Rio de Janeiro.

— Seria melhor para todos que as delações fossem logo divulgadas, e de uma vez — disse Temer em uma conversa informal de mais de uma hora no fim de semana.

Em dezembro passado, durante um encontro no Palácio do Planalto com Rodrigo Janot, procurador-geral da República, Temer adiantou para ele a mesma opinião. Não houve discordância. Foi a pedido de Janot que a ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, apressou-se a homologar as delações na semana seguinte à morte de Zavascki.

— Imagine o que poderia acontecer se as delações demorassem a ser divulgadas. Ou se fossem divulgadas aos poucos, uma por semana, digamos. Seria muito ruim para o país e, é claro, para o governo — calcula o presidente.

E se o conteúdo das delações produzirem estragos na imagem do governo? Afinal, alguns dos atuais ministros e o próprio Temer são citados em mais de uma delas. Temer responde:

— Quem for atingido pelas delações que se explique e que se defenda. Depois avaliaremos o que fazer. Quanto a mim, minha preocupação com isso é igual a zero.

Temer foi citado 43 vezes no documento do acordo de delação premiada de Cláudio Melo Filho, ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht. Em 2014, Temer pediu R$ 10 milhões a Marcelo Odebrecht, então presidente da empresa, para a campanha eleitoral do PMDB naquele ano.

— Não foram R$ 10 milhões. Marcelo doou pouco mais de R$ 11 milhões. O dinheiro foi depositado na conta do PMDB e pagou despesas de vários candidatos pelo país. Há comprovantes de tudo — garante Temer.

Ele conta que teve a curiosidade de ler com atenção a íntegra da delação de Melo Filho vazada para a imprensa.

— Quem se limita a ler apenas os títulos das matérias publicadas a respeito pode ficar com a impressão de que fui citado por envolvimento em 43 negócios. Mas não. Fui citado 43 vezes porque está escrito ali: Aí Temer me convidou para conversar. Aí Temer me recebeu na sala. Aí Temer perguntou se eu aceitaria um café… Para contar uma única história, meu nome foi mencionado 43 vezes — explica Temer, e até acha graça nisso.

Como presidente do PMDB, uma de suas tarefas era arranjar dinheiro para financiar campanhas. E ele não nega que o tenha feito.

— Isso nada tem a ver com caixa dois ou com a troca do dinheiro por favores do governo — registra. Quanto ao julgamento pela Justiça Eleitoral das contas de campanha da chapa Dilma-Temer na eleição de 2014…

A propósito, Temer revela que ganha corpo entre juristas que acompanham as investigações das contas a tese de que pode ter havido ali alguma infração penal, mas eleitoral, não. Se penal, o caso seria arquivado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dele se ocuparia a Justiça comum.

— Estou muito tranquilo, pelo que ouço dos meus advogados — afirma o presidente.

O fato é que 2016 terminou – se é que terminou – deixando a impressão em muita gente que Temer não concluiria o resto de mandato herdado da ex-presidente Dilma Rousseff. Em conversas com políticos em Brasília, mesmo entre aqueles que apoiam o governo, diversas previsões foram feitas a respeito de seu futuro:

Temer poderá ser vítima da lentidão do processo de recuperação da economia… A Justiça Eleitoral não tem como separar as contas de Dilma e de Temer, e ele poderá ter que sair… Tem emenda à Constituição no Congresso que, se aprovada, resultará em eleições diretas para presidente ainda em 2017…

Salvo um fato surpreendente, em um país acostumado a conviver com surpresas, Temer completará o mandato de Dilma. Ele não enxerga nenhuma surpresa capaz de desestabilizar seu governo – mas se enxergasse não seria surpresa. E concorda que o pior para ele já passou. Passou o discurso do golpe. Passaram as manifestações de ruas. A economia começou a reagir, embora menos do que ele gostaria. É vida que segue.

A não ser que a Lava-Jato o obrigue a proceder de outro modo, o presidente pretende seguir governando com a atual equipe de ministros. O que chamam de reforma ministerial terá se resumido às poucas mudanças promovidas por ele na semana passada. Moreira Franco virou ministro. O Ministério dos Direitos Humanos foi recriado. O da Justiça agora se chamará da Justiça e da Segurança Pública.

— Sabe quem primeiro falou em criar o Ministério da Segurança Pública? Fui eu — revela Temer. Foi ele que em 2002, quando apoiou a candidatura a presidente da República de José Serra (PSDB) contra a de Lula, sugeriu a Serra criar o Ministério da Segurança Pública, separado do da Justiça.

— A experiência que tive no governo de Franco Montoro como Secretário de Segurança Pública me marcou muito. A Segurança Pública é mais problema dos estados e municípios, diz a Constituição. Mas o governo federal, ainda mais quando estados e municípios enfrentam tantas dificuldades, não pode se omitir — justifica Temer.

VAGA DE TEORI

Donde se pode concluir (e a conclusão é desse repórter, mas ele não discordou quando a expus) que Alexandre de Moraes, atual ministro da Justiça, ficará onde está. Não irá para a vaga de Zavascki aberta no STF.

— Alexandre entende muito de segurança pública. Já foi secretário em São Paulo. Não digo que ele não possa ser indicado para a vaga de Teori, pois é um jurista respeitado, professor de Direito, autor de livros. Mas preciso dele na Justiça — adianta Temer.

Quando Zavascki morreu, o presidente pensou em indicar o sucessor dele em poucos dias. Queria escapar das pressões em torno de nomes. Desistiu a tempo. Poderiam dizer que ele queria influenciar nos destinos da Lava-Jato. Resultado: ele coleciona, hoje, 27 nomes de aspirantes à vaga.

Um deles é o do presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Martins Filho, patrocinado pelo ministro Gilmar Mendes, do STF, pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e juristas de peso. Temer nada diz a respeito das chances de Martins Filho vir a ser o indicado. Apenas o elogia. Mas receia, segundo me contou um auxiliar dele, que Martins Filho desperte uma forte reação de setores que o consideram conservador demais. Essa reação tem se manifestado nas últimas semanas, até mesmo fora do Brasil.

Não poderia então ser uma boa ideia indicar o nome de algum ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ)? Se o fizesse, Temer ganharia uma vaga no STJ para preencher com um nome ligado a ele. Mas não é bem assim. Ele ficaria de novo sujeito a pressões em torno de nomes para o STJ. Trocaria um problema por outro. O máximo que o presidente disse sobre isso foi que o substituto de Zavascki será anunciado em poucos dias, talvez nesta semana.

Por mais discreto e formal que seja, Temer não consegue disfarçar a sua euforia com os resultados das eleições da semana passada para presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado.

— Não me meti nas eleições. Mas os resultados foram plenamente satisfatórios para o governo —comentou.

Também pudera. A Câmara será presidida por Rodrigo Maia (DEM-RJ), reeleito com 293 votos de um total possível de 513. E o Senado por Eunício Oliveira (PMDB-CE), eleito com 61 votos de um total possível de 81. Os dois, mal foram eleitos, disseram a mesma coisa: tudo farão para correr com a aprovação das reformas do interesse do governo. Para aprová-las na Câmara será necessário um mínimo de 308 votos – 15 a mais do que teve Maia. E no Senado, 49 votos – 12 a menos do que teve Oliveira.

Presidente da República algum, da redemocratização do país em 1985 para cá, contou no Congresso com uma base de apoio como a que Temer construiu até aqui. Ele mesmo reconhece:

— Ao assumir o cargo, nas condições em que assumi, vi que a minha principal tarefa seria a de montar uma base no Congresso para aprovar as reformas. Popularidade?

— Ela virá se eu for bem-sucedido — imagina Temer.

— O meu será o governo das reformas que o país aguarda desde os tempos do presidente João Goulart.

Se ele conseguir aprovar a reforma da Previdência, a trabalhista e a política, depois de ter aprovado o teto dos gastos da União, terá tempo para viajar mais pelo país e pelo exterior, e para atender às reclamações da mulher que cobra sua atenção. Mas Temer ambiciona ainda aprovar a reforma tributária. Por ora, prefere chamá-la de “simplificação tributária”. Já começou a conversar a respeito.

o globo

06/02/2017

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