Filho de PM pode ficar cego após ser atingido por bala de borracha em manifestação

Filho de PM pode ficar cego após ser atingido por bala de borracha em manifestação

Num leito no sexto andar do Hospital do Souza Aguiar, Itamar dos Santos ainda aguarda um prognóstico sobre a sua vista direita, “desorganizada”, como explicaram médicos à família, depois de ser atingida em cheio por uma bala de borracha na manifestação da última sexta-feira, no Centro do Rio. Pego de surpresa pelo impacto que, num primeiro momento, pensou ser de um soco, não demorou a perceber que o golpe era mais duro do que imaginou. Com lesões gravíssimas no olho e fratura óssea no local, Itamar se agarra à fé por um milagre que o livre da cegueira.

Segundo o Extra, o carpinteiro de 35 anos conta que bastou colocar os pés na Cinelândia para decidir ir embora do local, onde grupos tentavam se reunir para protestar contra as reformas do trabalho e Previdência. “Só pensava em sair”, lembra. Segundo ele, havia muita fumaça vinda de um ônibus queimado nos arredores, além de uma multidão desesperada, fugindo de bombas de gás lacrimogênio. Com a estação do metrô da Carioca fechada, ele e os dois amigos que o acompanhavam partiram em busca de outra rota de fuga. Foi na Avenida Chile, na fração de segundo em que virou para procurar um deles, que a bala o acertou:

– A entrada do metrô foi fechada por seguranças, então fomos procurar outra forma de sair dali na mesma hora. Minutos depois, senti algo estranho no olho, um impacto forte. Coloquei a mão e notei que tinha muito sangue, logo senti a bala ali no lugar. ‘Isso aqui não é meu, pensei’. Tirei e joguei no chão – diz Itamar, socorrido já na Rua do Rezende por um desconhecido que o levou ao hospital.

Itamar não foi a única vítima na última sexta-feira, no Rio. Nas redes sociais, manifestantes relataram momentos de terror durante ação da polícia no protesto: bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo, balas de borracha e truculência atingiram a esmo quem passou pelo Centro. Ao menos nove pessoas chegaram a ser hospitalizadas por ferimentos causados pela PM.

Filho de um policial militar, Itamar se emociona ao falar dos agentes de segurança, colegas de profissão do seu pai. Ele não poupa críticas ao que considera ser um excesso de força dos policiais diante do que, segundo ele, era um protesto pacífico. Agora, quer que seu caso sirva de exemplo para que o uso de balas de borracha seja proibido. – Sinto muita tristeza, porque uma pessoa que age com essa violência só porque tem o poder, porque está com uma arma, faz esse tipo de coisa. Eu posso deitar aqui no meu travesseiro e ficar tranquilo, mas eles não devem dormir com essas barbaridades que fazem. Eles dizem que as balas de borracha não são para matar…- afirma, enquanto levanta a gaze, presa na testa por uma fita. Apontando para o olho, diz: – Não é? – questiona.

“Eu posso deitar aqui no meu travesseiro e ficar tranquilo, mas eles não devem dormir com essas barbaridades que fazem”, diz o homem Foto: Roberto Moreyra

Internado desde sexta-feira, o carpinteiro aguarda que o inchaço diminua para que especialistas possam avaliar a extensão dos danos causados e, enquanto espera, planeja o futuro em Portugal ao lado da esposa: o casal, que já queria deixar o Brasil por causa do profissão pouco reconhecida, da violência da cidade do Rio e das reformas trabalhista e da Previdência, agora tem o grave incidente como o ato final de sua relação com o país. – Naquele dia eu só queria sair da Cinelândia o mais rápido possível. Agora eu tenho mais pressa ainda para sair do Brasil. Em 2018, não vou ficar aqui de jeito nenhum – diz.

A Polícia Militar informa não ter sido comunicada sobre a denúncia de Itamar, “que deve ser feita através dos canais oficiais da Corporação”.

Treinamento para policiais deve ser prioridade

Ex-secretário nacional de Segurança, o coronel aposentado José Vicente da Silva Filho defende o uso de armas menos letais, como bombas de gás, cassetete, gás lacrimogênio e armas de borracha, na contenção de situações potencialmente perigosas. Segundo ele, tais recursos são perigosos se usados sem o treinamento adequado, como no caso do estudante Mateus Ferreira da Silva, de 33 anos, gravemente ferido após receber um golpe de cassetete de um policial militar.

– Vimos um capitão da PM fazendo um mau uso do cassetete, por exemplo. O equipamento deveria ter sido usado em pernas e braços e em um contexto muito diferente do que a gente viu. Falta preparo para ações específicas e, com exceção da polícia de São Paulo, em geral os agentes não recebem as atualizações necessárias – explicou.

Procurada pelo EXTRA, a Secretaria municipal de Saúde se limitou a dizer que o estado de saúde do paciente é estável. Por telefone, informou também que ele está em preparação para cirurgia.

04/05/2017

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