Estudo sugere novo rumo para diagnosticar e tratar depressão

A pesquisa por melhores diagnósticos e tratamentos para pacientes com depressão poderá ter um novo caminho a partir da recente descoberta de um novo “biomarcador” — característica do organismo ligada a algum desvio e que pode ser medida. Dentro de alguns anos, talvez seja possível fazer um teste, como um exame de sangue, para diagnosticar a doença.

O biomarcador é a acetil-L-carnitina (LAC), substância importante do sistema nervoso e ligada ao humor. Os pesquisadores encontraram níveis mais baixos dela em pacientes com depressão. A concentração de LAC era ainda menor em pessoas com histórico de distúrbio resistente ao tratamento, revela o Terra.

De acordo com os cientistas, evidências sugerem que um subtipo de depressão poderia ser detectado pelos níveis da substância. Essa divisão seria mais severa, teria entre as causas traumas de infância e se manifestaria mais cedo na vida do paciente, além de resistir à medicação.

O estudo foi publicado nesta segunda-feira (30) pela revista científica norte-americana Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS). Pesquisas anteriores já apontavam mecanismos ligados ao LAC em roedores com comportamentos análogos à depressão. Nessa nova investigação, os cientistas analisaram humanos.

O Terra entrou em contato com um dos cientistas envolvidos na descoberta. Perguntado sobre que tipo de pesquisa seus apontamentos deverão estimular, Bruce McEwen, da americana Rockefeller University, respondeu: “Busca por mais biomarcadores, uso da suplementação de LAC tanto como tratamento como para identificar novos remédios para esse subtipo [de depressão]”.

McEwen explica que novos biomarcadores são necessários para, usados em combinação, identificar ou ao menos delimitar subtipos mais específicos de depressão.

Os baixos níveis da substância poderiam ser, de acordo com o paper de divulgação da pesquisa, “um inovador alvo biológico no tratamento da depressão”. “Outros estudos mostraram que tratamentos com LAC são tolerados e efetivos contra sintomas depressivos, mas esses estudos focaram principalmente em grupos pequenos de pacientes idosos com distimia ou fibromialgia”, dizem os pesquisadores.

Diagnóstico e tratamento atuais

A professora Luciana Sarin, ligada ao Departamento de Psiquiatria da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), analisou o artigo a pedido do Terra. Ela afirma que descobertas como essa publicada na PNAS representam mudança no foco dos tratamentos. “Síndromes antes consideradas exclusivamente ‘mentais’ estão sendo reconsideradas como síndromes de alterações de sistemas neurais, cognitivos e comportamentais.”

Segundo ela, as possibilidades de novos tratamentos com base no mecanismo da LAC parecem promissoras. Atualmente, explica, “a remissão completa dos sintomas depressivos é a exceção e não a regra.” A professora dá números: “Apenas um terço dos pacientes responde ao primeiro tratamento com antidepressivos, enquanto 30% a 40% desenvolvem depressão resistente ao tratamento”.

As dificuldades, ilustradas pelos números de Luciana Sarin, não aparecem apenas na fase terapêutica. O diagnóstico também é complexo. Para ser considerado um paciente com depressão, é necessário identificar ao menos 5 sintomas de uma lista de 9, muitos deles indicados por situações opostas – aumento ou perda de apetite, insônia ou aumento de sono, por exemplo.

Mesmo pacientes diagnosticados podem apresentar quadros bastante distintos e com reações divergentes aos tratamentos. Sarin aponta a falta de biomarcadores como um dos maiores limites às terapias existentes.

Limites da investigação

A pesquisa recém lançada, porém, tem suas limitações. McEwen explicou que ainda não é possível saber se o mecanismo identificado funciona da mesma forma em mais tipos de depressão além do subtipo delimitado.

Mesmo a classificação como subtipo – ou “endofenótipo”, no jargão científico – de depressão tem ressalvas, como explica a professora Sarin: “Para ser considerada um endofenótipo, uma característica, além de estar associada à doença e poder ser medida de forma confiável, deve ser hereditária”. Também é necessário que se manifeste dessa forma independentemente da doença estar ou não ativa no corpo.

Tanto os cientistas responsáveis pela pesquisa quanto Luciana Sarin dizem que o fato de todos os pacientes estarem em um episódio depressivo na época do exame é um problema. “ Por isso não foi possível estabelecer se essa condição era prévia à depressão”, explicou a professora da Unifesp.

Ainda, os 116 indivíduos analisados devem ser considerados como um ponto de partida. Para validar um subtipo de depressão são necessárias informações de um número maior de pessoas.

02/08/2018

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