Em delação, Funaro diz que Temer recebeu propina de R$ 20 milhões de dono da Gol

O operador financeiro Lúcio Bolonha Funaro acusou o presidente Michel Temer de receber propina de R$ 20 milhões de Henrique Constantino, um dos fundadores da Gol Linhas Aéreas, em troca de apoio ao projeto de abertura do setor aéreo ao capital estrangeiro. A suposta propina teria sido paga em horas de voo na campanha eleitoral de 2014, segundo disse ao GLOBO fonte que conhece o caso.

Ano passado, com apoio do governo Temer, durante o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, a Câmara aprovou medida provisória que permitia 100% do controle acionário de empresas aéreas brasileiras pelo capital externo. Funaro fez a acusação em um dos depoimentos de sua delação premiada, homologada pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF).

Como se trata de fato relacionado ao exercício do mandato de presidente, se quiser, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, poderá incluir as informações na denúncia que está preparando contra Temer. O presidente e o ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, entre outros, estão sendo investigados por obstrução de justiça e organização criminosa.

Esta é a última semana de Janot depois de quatro anos como chefe do Ministério Público Federal. Além da segunda denúncia contra Temer, Janot deve apresentar ao STF a denúncia por organização criminosa formada por um núcleo do PMDB da Câmara. Entre os líderes do grupo estaria Temer.

Na sexta-feira, Janot denunciou suposta organização criminosa do PMDB do Senado. Senadores do partido teriam recebido mais de R$ 860 milhões em propina, causando prejuízo de mais de R$ 5 bilhões à Petrobras. Para Janot, um grupo de políticos do PMDB, que se mantém no poder em sucessivos governos nas últimas décadas, seria a maior estrutura de corrupção em atividade no país.

Ele entende que este grupo se apropriou de importantes fatias de poder dos governos Itamar, Fernando Henrique, Lula e Dilma com objetivo central de transformar cargos estratégicos em fontes de recursos para campanhas eleitorais e para enriquecimento pessoal.

LIMPEZA DE GAVETAS

Antes de limpar as gavetas, Janot deverá definir o que fazer em relação aos acordos de delação de Joesley Batista, um dos donos da JBS, e do ex-diretor de Assuntos Institucionais da J&F Ricardo Saud, entre outros executivos da holding. O acordo está sob suspeita desde que o conteúdo de conversa entre os dois revelou suposta atuação dupla do ex-procurador Marcello Miller nas negociações. Miller teria atuado como procurador e, ao mesmo tempo, como advogado informal dos executivos.

Em outro depoimento da delação, Funaro confirmou que Joesley pagou para que ele permanecesse em silêncio na prisão, conforme revelou o GLOBO. A informação deve robustecer a denúncia de Janot contra Temer.

Pelo cronograma inicial, Janot e equipe deveriam concluir a denúncia até a sexta-feira passada, uma semana antes do final do mandato dele como procurador-geral. Mas depois da devolução por um dia da delação de Funaro, para ajustes pedidos pelo STF, e da recente confusão sobre a delação de Joesley Batista, a acusação formal só deve chegar no Supremo nesta semana.

As declarações de Funaro sobre a suposta propina para Temer são um complemento de depoimento dele à Polícia Federal em 14 de junho deste ano. Em determinado momento do interrogatório, ele revelou o pagamento de R$ 20 milhões em propina para as campanhas de Gabriel Chalita à prefeitura de São Paulo, em 2012, e de Temer a vice-presidente, em 2014.

O dinheiro seria referente a uma “comissão” sobre repasses de recursos do FI-FGTS para obras de interesse da BRVIAS, da família Constantino, e para a LLX, de Eike Batista. “Ambas por orientação/pedido do presidente Michel Temer”, afirmou. Funaro apontou ainda a participação do ex-vice-presidente da Caixa Econômica Federal Fábio Cleto, um dos delatores da Lava-Jato, e do ex-ministro Geddel Vieira Lima, preso na sexta-feira, nas supostas fraudes.

Em interrogatório na Procuradoria-Geral já como delator, dois meses depois do depoimento na PF, Funaro voltou a associar Constantino a pagamento de propina para Temer. Desta vez, ele disse que pelo menos R$ 20 milhões teriam sido convertidos em horas de vôo para a campanha de Temer em 2014, em troca do apoio à abertura do setor aéreo ao capital externo.

A proposta chegou à Câmara em forma de medida provisória editada pela então presidente Dilma Rousseff. A MP previa aumento de 20% para 49% da participação do capital externo no controle acionário das companhias aéreas brasileiras. Em junho do ano passado, num movimento surpreendente, a base governista de Temer, naquele momento já presidente em exercício, eliminou todas as restrições ao capital externo.

A proposta atendia a um pleito das grandes empresas do setor. As empresas brasileiras estavam, e algumas ainda estão, na expectativa da entrada do capital estrangeiro para reforçar as próprias contas. A Gol era uma das empresas que lideravam o movimento. Logo após a aprovação do projeto, em 6 de junho do ano passado, o então líder do governo, André Moura (PSC-SE), festejou a vitória.

— Era um ponto importante para o governo (Temer) aumentar o capital estrangeiro para 100%, mesmo porque a crise econômica do país hoje nos obriga a isso. Quando nós estamos aumentando o capital estrangeiro de 49% para 100% não é porque o governo queria aumentar, é porque a necessidade nos impõe isso pela crise econômica incompetente, equivocada e corrupta do PT — afirmou Moura.

A festa só não foi completa porque, pressionado pelas companhias regionais, o Senado aprovou a medida provisória, mas, num acordo prévio com Temer, exigiu mudanças na lei. A partir do acerto, o presidente vetou o projeto e, logo em seguida, enviou uma nova proposta.

O novo texto mantém a abertura de 100% do setor aéreo ao capital externo. A diferença é que, desta vez, o projeto contém condicionantes para preservar parte do mercado para as empresas regionais brasileiras. O projeto está parado no Câmara. A proposta só não foi adiante por causa dos abalos políticos provocados pela delação de Joesley Batista.

O presidente Michel Temer, segundo o Palácio do Planalto, informou que fez uso de voos particulares na campanha de 2014, “tudo pago pelo Comitê de campanha da ex-presidente Dilma”. De acordo com o Palácio, Temer nunca recebeu valores para beneficiar quem quer que seja: “O projeto de abertura do setor aéreo ao capital estrangeiro foi um anseio de todo o setor, debatido amplamente. E não interesse de uma só empresa”.

O GLOBO tentou, sem sucesso, falar com Constantino . De acordo com assessores, ele não iria fazer comentários sobre a acusação de Funaro.

10/09/2017

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