Campanha busca ampliar o teste do pezinho usado no SUS

“Eu matei os neurônios do meu filho, sem saber, a cada gole do leite do meu peito”. Este desabafo da jornalista Larissa Carvalho, repórter da TV Globo Minas, em Belo Horizonte (MG), chama a atenção para dois problemas que acomete muitas crianças com doenças raras: o diagnóstico tardio dessas doenças e a baixíssima cobertura do “teste do pezinho” realizado no Sistema Único de Saúde (SUS). Larissa é mãe do Théo, um sorridente e carinhoso menino de 5 anos, que tem uma paralisia cerebral provocada por uma doença genética rara: a acidúria glutárica, que impede o metabolismo das proteínas ingeridas pela criança em seus primeiros dias de vida.

Larissa compartilhou sua experiência em uma palestra para os colaboradores do Grupo Tiradentes, dentro do evento “Um amor que transforma”, promovido na última sexta-feira (7), em homenagem ao Dia das Mães. Ela explicou que, por causa da doença, as proteínas não metabolizadas pelo corpo destroem as células do sistema nervoso central, provocando sequelas graves e irreversíveis. No caso de Théo, foi afetada uma área do cérebro responsável pelo equilíbrio, pelo tônus muscular e pela coordenação motora. Por isso, ele ainda não fala, nem anda, nem senta e tem dificuldades de se equilibrar.

Segundo a jornalista, a doença do menino não foi detectada a tempo e ela, sem saber, dava alimentação incorreta ao garoto. “Desde sempre essas crianças precisam de alimentação equilibrada e eu não dei essa alimentação. Eu achava que estava tudo bem com o meu bebê e não estava”, lamentou ela, pontuando que crianças com doenças raras que não recebem o diagnóstico e tratamento correto têm até 97% de chances de ficar com sequelas, como aconteceu com Théo. Do contrário, quando são descobertas a tempo e tratadas adequadamente, os bebês têm até 88% de chances de cura, podendo até levar uma infância normal.

Outro motivo desconhecido por ela foi a deficiência do teste do pezinho aplicado nas unidades do SUS. Esse teste é um exame de sangue feito dias depois do parto, que rastreia e detecta doenças congênitas ou genéticas a serem desenvolvidas e que geralmente é feito junto com a aplicação das primeiras vacinas. O problema é que o teste na rede pública detecta apenas seis doenças raras, enquanto que os aplicados na rede privada de saúde conseguem diagnosticar até 54 doenças. “Se eu tivesse pagado para fazer este teste na rede particular, uns 400 reais, eu teria descoberto e tratado essa doença na hora certa”, lamenta Larissa.

Os sentimentos como revolta, tristeza e culpa pelo problema de saúde do filho foram logo transformados em luta. A jornalista passou a fazer palestras em todo o país sobre maternidade e filhos com deficiência, além de produzir reportagens sobre o assunto em programas e telejornais da Rede Globo. Ao mesmo tempo, com o apoio do Instituto Vidas Raras, uma ONG que defende os direitos das pessoas com doenças raras, ela iniciou uma campanha de coleta de assinaturas em uma petição pública para que o governo federal implante o teste do pezinho completo no SUS, garantindo que a rede pública faça o mesmo teste do pezinho disponível na rede particular.

“Eu não poderia deixar uma tragédia dessa ficar calada dentro da minha casa. É o teste do pezinho que precisa mudar. Eu preciso transformar essa história trágica e injusta numa história de esperança e de mudanças”, define a repórter, evocando a palavra “transformação”, adotada como lema em 2021 pelo Grupo Tiradentes.

Por força da mobilização e da repercussão dos relatos de Larissa e de outras mães na mesma situação, leis estaduais que determinam a aplicação do teste do pezinho ampliado na rede pública de saúde foram aprovadas e sancionadas em Minas Gerais, Paraíba e Distrito Federal. Já no último dia 29 de abril, um projeto de lei estendendo a regra para todo o Brasil foi aprovado no Senado Federal e encaminhado para a sanção do presidente Jair Bolsonaro. “Se o presidente sancionar e regulamentar essa lei, nenhum desses futuros bebês com doenças raras vai ser condenado à cadeira de rodas ou à cegueira, como o meu filho. É uma mudança enorme no Brasil. Pelo meu filho não há mais o que fazer, mas pelos Théos que virão, eu quero mudar”, afirma Larissa.

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