1/3 dos capturados por suspeita de ataques no Ceará é adolescente

Pelo menos um terço dos capturados por suspeita de envolvimento nos ataques criminosos no Ceará é adolescente. O levantamento é da Defensoria Pública Estadual. Até este domingo, 13, o governo estadual informou que 353 pessoas haviam sido presas. Facções criminosas estão ameaçando de morte adolescentes e familiares, além de cooptar os jovens e adultos com pagamento de R$ 1 mil pela queima de veículos e até R$ 5 mil pela explosão de prédios e viadutos. Nas unidades prisionais, sob intervenção do governo desde o dia 2, detentos estão sem visitas, sem comunicação, sem trabalho e em celas superlotadas, segundo os Conselhos Estaduais Penitenciário e de Direitos Humanos.

Supervisora das Defensorias Criminais, a defensora Patrícia de Sá diz que até sexta-feira passada dos 300 capturados pela polícia, 100 eram menores de 18 anos – há até um de 12 anos. São três os perfis de adolescentes apreendidos, afirma ela. “Há aqueles que já tinham envolvimento anterior com a facção e participaram; há os que não têm envolvimento, mas eventualmente foram pagos para fazer alguns atos criminosos; e outros agem por medo e ameaça das facções”, explica. De acordo com Patrícia, entre os capturados por envolvimento nos ataques, nem todos são de facções criminosas. “A cooptação e a ameaça são reais. Existem adolescentes que estão fazendo por coação ou por ameaça de serem mortos ou terem suas famílias vitimadas. Alguns deles também fazem parte de famílias expulsas das suas casas por facções.”

Entre os adultos presos, haveria casos de usuários de drogas que estariam tendo as dívidas quitadas com traficantes de drogas caso aceitem atuar nos ataques. O Estado apurou ainda que foram presos ladrões “comuns” de combustível, que estão sendo detidos por suposto envolvimento na facilitação do material para os ataques, porém eles não teriam relação com grupos do crime organizado. Uma mulher teria sido presa no lugar do marido, que estaria relacionado aos atentados, mas não estava em casa no momento da abordagem policial, revela o MSN.

Para Beatriz Xavier, presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos, falta transparência por parte do governo estadual no detalhamento desses presos. “Meninos de 13 anos estão sendo apreendidos. E, nessas capturas, vemos se repetir uma prática reiterada das polícias de prender gente negra e pobre que está na periferia passando na rua. Temos ouvido isso de diversas fontes”, conta.

Beatriz afirma que há muitos casos de adultos que estão sendo detidos sem flagrante. “Prende porque está com tornozeleira ou porque responde a um processo passado. Prende primeiro para saber depois”, afirma. O Conselho recebeu denúncias de tortura nas unidades prisionais e socioeducativas. “Os procedimentos são abusivos e as abordagens policiais, indiscriminadas. “O que preocupa é uma prisão em massa. Não sabemos exatamente quem são essas pessoas. Tem um risco muito grave de ter havido violação de direitos nesse trabalho”, diz a presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos.

Procurada, a Secretaria de Segurança Pública do Ceará informou que não pode divulgar detalhes para não atrapalhar as investigações, mas afirmou que todas as ações tomadas são pautadas pelo absoluto respeito da lei.

Presídios

Uma força-tarefa foi instalada pela Defensoria nas unidades prisionais da região metropolitana de Fortaleza para coletar informações sobre a situação no sistema penitenciário. Após visitas dos defensores na semana passada, um relatório está em elaboração pelo órgão e até sexta-feira será encaminhado para o secretário de Administração Penitenciária, Luís Mauro Albuquerque.

Segundo a presidente do Conselho Penitenciário, Ruth Vieira, que visitou unidades prisionais na semana passada, o clima nos presídios é de “ódio” e “tensão” com a suspensão da rotina comum dos presos. As tomadas e os televisores foram retirados e até o número de lençóis está sendo controlado. “A pessoa ser mantida sem visita, sem comunicação, sem trabalho, sem estudo e em uma cela superlotada tende a surtar. O surto é incontrolável e contagia. Se isso acontecer, não sei como o Estado estaria preparado para retomar o equilíbrio”, diz. “Estamos em intervenção. Mas essa intervenção precisa ser rápida. Não pode se estender sem tempo determinado. Se ela se estender, vai se caracterizar tortura psicológica.”

Em visita às unidades, Ruth diz ter visto celas com 18 pessoas, tendo capacidade para seis. Há ainda relatos informais sobre tortura dentro dos presídios. Familiares têm procurado o Conselho em busca de notícias sobre os detentos. Para Ruth, falta transparência do governo em relação aos presos sobre os detalhes da intervenção e do fim da situação. “Eles mesmos lá dentro não sabem o que está acontecendo ou quando aquilo vai acabar. Digo para as famílias terem paciência porque essa é uma situação provisória. Temos tentado acalmar os familiares”, conta a advogada criminalista e ex-diretora do Instituto Penal Professor Olavo Oliveira II (IPPOO II).

“Com ociosidade grande e celas superlotadas, já verificamos situação de revezamento para dormir. É um agravante porque eles podem não aguentar. Vai ficando muito tenso. Ali tem crise de choro, outro tem crise de raiva. Começam a acontecer esses desequilíbrios. Vinte e quatros horas dentro de uma cela superlotada sem nenhuma perspectiva? É importante ter uma agenda garantista de direitos para dar uma aliviada na situação. Desse jeito, pode gerar problemas maiores como uma rebelião”, avalia Ruth.

A Secretaria de Administração Penitenciária afirmou que “todas as ações tomadas dentro das unidades prisionais são pautadas absolutamente pelo estrito cumprimento da lei” e destacou que “todos os procedimentos são acompanhados diariamente pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública do Estado”. Segundo a pasta, as visitas estão suspensas, provisoriamente, em 2 das 16 unidades prisionais do Estado.

14/01/2019

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