Reforma trabalhista: confira os riscos de negociação direta entre o patrão e o empregado

A principal premissa da reforma trabalhista, que entrou em vigor no dia 11, é a prevalência do negociado sobre o legislado. Mas esse é justamente um dos pontos mais criticados por entidades de classe, sindicatos e advogados, que acreditam que o trabalhador é a parte mais vulnerável na mesa de negociação. Juristas e empresários, porém, defendem que o empregado tem a prerrogativa de manifestar expressamente sua vontade. Entre os pontos passíveis de pactuação individual e direta, sem a necessidade de participação de sindicatos estão: a compensação de banco de horas e feriados, e o parcelamento de férias. Questões mais sensíveis, como a redução de jornada com corte proporcional de salário, só podem ser firmadas por convenção ou acordo coletivo.

— Embora a reforma altere a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), dois artigos protegem o trabalhador. O artigo 9º afirma que qualquer acordo contrário aos preceitos da legislação trabalhista será “nulo de pleno direito”. Já o artigo 468 destaca que é preciso haver consentimento das duas partes em qualquer acordo entre patrão e empregado. E deixa claro que, em caso de prejuízo ao funcionário, esse acordo pode, sim, ser anulado — lembrou Fabio Medeiros, especialista em Direito Trabalhista do escritório Lobo de Rizzo.

Para Flávio Pires, sócio do setor trabalhista do escritório Siqueira Castro Advogados, a intenção da legislação é flexibilizar situações presentes no novo mercado de trabalho.

— O empregador não pode tudo. A legislação está aí para ser cumprida — disse ele.

A conversão de contratos de trabalhos é um dos pontos mais controversos. Mas especialistas alertam que a reforma criou barreiras para impedir a dispensa deliberada de trabalhadores e sua recontratação de forma precarizada.

— A contratação de um ex- funcionário como intermitente, pessoa jurídica ou terceirizado só pode ocorrer em um prazo de 18 meses. A lei estabelece esse prazo para evitar prejuízos ao trabalhador — observou Pires.

A reforma trabalhista também cria a figura do trabalhador hipersuficiente, aquele que tem nível superior e recebe mais do que R$ 11.062,62, o equivalente a dois tetos da Previdência Social (atualmente, de R$ 5.531,31). Na prática, as cláusulas do contrato desse empregado poderão valer como convenção coletiva e prevalecer sobre a lei. Quem preenche esses requisitos pode negociar direta e individualmente seu reajuste anual e direitos que os demais trabalhadores só podem pactuar com a intervenção do sindicato.

Duas categorias de empregados

O advogado Luiz Marcelo Góis:“Lei impõe limites a contratante” O advogado Luiz Marcelo Góis:“Lei impõe limites a contratante” Foto: Divulgação / FGV
Entre outros pontos a serem negociados estão: troca do dia de feriado, redução do intervalo ou do horário de almoço para 30 minutos e compensação do banco de horas.

— A lei criou duas categorias de empregados. A reforma trouxe a possibilidade de a empresa fazer acordo individual sem a necessidade de pactuação com documento — afirmou Luiz Marcelo Góis, professor de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Luciana Dessimoni, especialista em Direito Trabalhista do Nakano Advogados Associados, alerta que, mesmo sem a obrigatoriedade de registro, a documentação oferece garantias ao funcionário e ao empregador.

— Além disso, nos contratos individuais de trabalho, só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim, desde que não resulte, direta ou indiretamente, em prejuízos ao empregado — disse Luciana.

Para o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, o sindicato vai dar salvaguardas.

— Nenhuma lei retroage para prejudicar o trabalhador. Os acordos coletivos têm salvaguardas. A orientação é que o trabalhador procure o sindicato — declarou.

Entrevista: Gilberto Maistro Jr., professor de Direito da faculdade São Bernardo

Gilberto Maistro Jr., professor de Direito da faculdade São Bernardo Gilberto Maistro Jr., professor de Direito da faculdade São Bernardo Foto: Divulgação/ Tau Farias
Quais os pontos em que o trabalhador fica mais vulnerável?

São três artigos, mas um deles foi alterado pela Medida Provisória 808. O ponto mais sensível é o artigo 477 A, que permite a dispensa coletiva sem prévia autorização do sindicato. O artigo 442 B estabelecia exclusividade na contratação de autônomo (ele estaria preso a um único empregador). Isso foi alterado pela MP, o que melhorou a situação desses trabalhadores, mas ainda pode precarizar as relações. Já a alteração do artigo 4 A da Lei 6.019/1974 , que é o artigo segundo da reforma, deu permissão de terceirização da atividade-fim. Esses pontos, na minha avaliação, prejudicam a proteção social do trabalhador.

Se o empregador se sentir prejudicado em alguma negociação, o que ele pode fazer?

Ele pode procurar a empresa, o sindicato, ou fazer denúncia ao Ministério do Trabalho ou ao Ministério Público do Trabalho. Mas, se quiser ir à Justiça, terá que provar que foi coagido, por exemplo, a assinar ou pactuar a mudança, o que é muito difícil.

Jornal Extra

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