Leilão de imóveis por preço baixo tem riscos; veja os direitos do devedor

Falta de informações no edital é razão para atrasar ou até anular o negócio. Proprietário inadimplente pode pedir liminar para evitar depejo do imóvel

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Um anúncio na internet mostra o que parece ser o imóvel dos sonhos. Bem localizado, amplo e ofertado por metade do valor de mercado. Ao ligar para o anunciante, o interessado descobre que não é uma imobiliária, mas uma assessoria especializada em leilões – modalidade cada vez mais presente no segmento imobiliário.

A atendente informa, então, que o imóvel tem um preço atrativo porque será leiloado e retomado de alguém que não pagou as contas. Por telefone, ela diz que não é preciso se preocupar com a parte jurídica do negócio, mas existe um “porém”. O imóvel está ocupado e o possível comprador não pode visitá-lo antes de fechar o negócio. Alguém ainda mora lá e, talvez, brigue na justiça para não sair.

ANTES DE COMPRAR IMÓVEL EM LEILÃO, VERIFIQUE:
Se há dívidas pendentes: o comprador deve quitá-las (em caso de IPTU e condomínio) e pode pedir desconto na compra do imóvel em caso positivo.
Se o imóvel está ocupado: o devedor pode entrar na justiça para impedir que seja despejado e atrasar entrega do bem.
Se há ações judiciais: qualquer pendência na Justiça que envolva o leilão do imóvel a ser leiloado pode pesar contra o novo proprietário.
Condições de venda: alguns leilões pedem o pagamento à vista, outros permitem financiar com o banco. Esta informação deve estar no edital.
Comissão do leiloeiro: o edital deve informar o percentual do valor fechado no negócio que será destinado ao leiloeiro.
Impostos e taxas: além do valor da compra, é preciso reservar um dinheiro para a escritura e tributos como o ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis).
Estado de conservação do imóvel: o edital deve descrever quaisquer problemas que o imóvel tenha, como infiltrações ou falhas que comprometam sua avaliação.
Preço mínimo: no edital, também é preciso ver o valor do lance mínimo a ser ofertado no leilão.
                           

“Não é por acaso que os imóveis vendidos em leilão valem bem menos que o preço de mercado. Todos os riscos estão embutidos no baixo preço”, explica André Junqueira, advogado especializado em direito imobiliário. Estes riscos podem variar de problemas com a documentação até dívidas não pagas, que podem ser repassadas para o novo proprietário.

1 a cada 20 imóveis torna-se viável
Investidor há 18 anos e especializado em leilões de imóveis, Carlos Alberto Pereira conta que a cada 20 imóveis ofertados em leilão, apenas um torna-se viável para arrematar, devido aos problemas que surgem na análise da documentação e demais riscos do negócio. “Não dá para se aventurar com leilão sem antes conhecer o mercado. Por isso, é mais fácil para o investidor do que para quem procura a casa própria”, defende.

Pereira calcula já ter arrematado cerca de 300 imóveis para investimento e em torno de 1 mil para clientes. Ele diz que é possível obter lucro na revenda entre 50% e 100% sobre o valor investido. Mas pondera que esse mercado ficou mais concorrido a partir de 2012, com mais pessoas disputando lances, o que eleva um pouco o valor final de compra.

Inadimplência maior estimula leilões
Um imóvel pode ir a leilão por atraso de mais de três meses nas parcelas do financiamento imobiliário. O prazo para o devedor resolver o atraso das parcelas com o banco após a notificação no cartório é de três meses se ele for financiado pelo SFH (Sistema Financeiro da Habitação) e de 15 dias pelo SFI (Sistema Financeiro Imobiliário). Passado esse prazo, o imóvel vira propriedade do banco e segue para leilão extrajudicial.

Também existe outra modalidade de leilão, por via judicial. Ele geralmente decorre de ações movidas por condomínios, por falta de pagamento das mensalidades, ou por prefeituras, pela inadimplência com o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano).

Na Caixa Econômica Federal, que controla cerca de 70% do crédito imobiliário do país, onúmero de compradores que perderam o imóvel saltou 53% no ano passado, mostrou em junho uma reportagem do G1. Em 2015, 13.137 unidades foram ofertadas em leilão extrajudicial por inadimplência, contra 8.541 nos 12 meses anteriores. Desde 2010, esse aumento foi de 93%.

Acompanhando esse aumento, os leilões judiciais de imóveis também aceleraram com as ações por falta de pagamento dos condomínios, graças ao novo Código de Processo Civil (CPC), que entrou em vigor em março, segundo Junqueira. Elas aumentaram cerca de 50% em seu escritório desde a vigência a lei, conta. Antes levava-se anos para resolver o problema com condomínios na justiça. Agora, com uma parcela em atraso e se o devedor não pagar em 72 horas após ser notificado, o condomínio já pode penhorar o imóvel em 10 dias.

Tanto no leilão judicial (condomínios e prefeituras) quanto no extrajudicial (geralmente bancos), o processo demora. O comprador corre o risco de levar meses e até anos para conseguir entrar no imóvel que adquiriu.


DIREITOS DO PROPRIETÁRIO

Veja quais medidas o devedor pode tomar para evitar o leilão de seu imóvel:

leilão (Foto: Arte/G1)

Após ser notificado de que seu imóvel irá a leilão por falta de pagamento, o dono do imóvel pode tentar rever a negociação das condições de sua dívida na justiça e pedir uma liminar para tentar impedir o negócio, explica a diretora jurídica da Associação dos Mutuários do Estado de São Paulo (Amspa), Tathiana Cromwell. “Tem muitos proprietarios que ingressam com ação de revisão da prestação e do saldo devedor para discutir a cobrança de juros. Nesse caso, a justiça pode aceitar e mandar reverter o leilão”, diz.


 (Foto: Arte/G1)

Após o leilão, o devedor que ainda reside no imóvel pode pedir uma liminar na Justiça para tentar impedir seu despejo. Tahiana explica que, nesta situação, quem comprou o imóvel terá que se envolver um uma briga judicial que pode durar anos até uma solução definitiva, já que é possível recorrer (questionar as decisões judiciais). Até o proprietário ser notificado e o leilão acontecer, pode levar entre seis meses e um ano. No judiciário, o processo pode levar mais tempo e até passar de um ano, explica Junqueira. “O proprietário ganha tempo com essa demora judicial”, diz Junqueira.


 (Foto: Arte/G1)

Caso o proprietário não seja informado sobre o leilão de seu imóvel, ele pode entrar com uma ação para anular o negócio, mesmo que ele já tenha sido arrematado. Geralmente, é o leiloeiro o responsável por notificar o devedor e disponibilizar esta informação no edital em leilões extrajudiciais. No leilão judicial, ele é intimado por um juiz.


CUIDADOS DO COMPRADOR

Veja os riscos e cuidados antes de arrematar um imóvel por leilão:

 (Foto: Arte/G1)

Se faltar alguma informação relevante no edital do leilões, o comprador pode ter problemas depois do negócio. Qualquer problema no imóvel, como no encanamento, deve ser mencionado no edital. O edital deve ser claro e conter a data do leilão, o estado de conservação do imóvel, a forma de pagamento e taxas e impostos envolvidos. Também deve informar a comissão do leiloeiro e o preço mínimo pedido. É importante verificar, no caso do leilão judicial, se o devedor foi intimado por um juiz. Se isso não aconteceu, o leilão pode ser anulado, alerta a diretora jurídica da Amspa, Tathiana Cromwell.


 (Foto: Arte/G1)

É preciso verificar se o imóvel tem todas as certidões que comprovam a quitação de possíveis dívidas judiciais ou de crédito. Esses documentos comprovam que o imóvel não tem nenhum problema que possa recair sobre o comprador depois do leilão e gerar alguma surpresa desagradável, explica o especialista em direito imobiliário Junqueira.


 (Foto: Arte/G1)

Quem sonha com a casa própria precisa estar ciente de que pode ter que comprar o imóvel sem poder visitá-lo, já que o atual morador não é obrigado a permitir a entrada enquanto não for despejado. É possível que o estado de conservação esteja comprometido e que o imóvel exija uma reforma. Para o investidor, pode não fazer muita diferença dentro do lucro esperado. Mas para quem pretende morar, há risco de infiltrações e problemas hidráulicos, elétricos e estéticos que não podem ser estimados antes. O investidor Pereira recomenda que o interessado consulte o síndico ou porteiro do prédio para obter o máximo de informações possível.


 (Foto: Arte/G1)

Se o edital não mencionar que o imóvel tem dívidas de condomínio ou IPTU em atraso, a cobrança inesperada pode vir e questionar isso na justiça pode gerar uma grande dor de cabeça ao comprador, alerta Junqueira. Por isso é importante certificar-se de que o edital tem documentos anexos com declaração de que o imóvel tem todos seus compromissos quitados antes de fechar o negócio. “O importante é não ser pego de surpresa. O interessado tem o direito de saber se existe uma dívida de R$ 30 mil e avaliar se vale a pena assumi-la ao comprar o imóvel”, diz o advogado.


 (Foto: Arte/G1)

Tathiana, da Amspa, recomenda sempre verificar se o imóvel está ocupado no momento do leilão. “É preferível escolher imóveis desocupados”, diz. O devedor que reside no bem pode se recusar a deixar o imóvel e pedir uma liminar na justiça para reverter o leilão. Isso pode arrastar o caso por muito tempo até que o comprador tenha direito a usufruir do imóvel que comprou. Esse risco geralmente reduz o valor inicial do imóvel no leilão, segundo Junqueira. “O fato de ter alguém ocupando o imóvel deprecia ainda mais seu valor de oferta”, diz.


 (Foto: Arte/G1)

Se o devedor não for notificado pela justiça ou por um órgão responsável que seu imóvel será leiloado por falta de pagamento, a lei prevê que ele pode pedir a nulidade do negócio na justiça. “Isso pode acontecer mesmo que o imóvel já tenha sido arrematado. Neste caso o leilão é revertido e o comprador recebe o dinheiro de volta, mas terá perdido seu tempo”, explica Junqueira.


 (Foto: Arte/G1)

Segundo Tathiana, da Amspa, muitos devedores entram com ações na justiça para rever o saldo devedor de suas dívidas e tentar impedir que o imóvel seja leiloado. Por isso é importante levantar junto aos tribunais se não há alguma ação pedindo liminar para permanecer no imóvel, diz a especialista. “O comprador pode ter que entrar na justiça para pedir para desocupar o imóvel, mas o ex-proprietário pode recorrer e a ação se arrastar por muito tempo. Pode levar entre 3 e 4 anos até que se resolva. Por isso, se o objetivo é morar e não investir, o risco é muito alto”, diz Tathiana.


 (Foto: Arte/G1)

Depois que o imóvel foi arrematado, não é mais possível desistir do negócio. Isso só é possível, diz o advogado Junqueira, se ele comprovar que foi ocultada alguma informação importante como dívidas em atraso no condomínio que não estavam no edital, por erro do credor, ou culpa do leiloeiro responsável.

g1

19/08/16

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