Beber sem perder reflexos não configura crime

Trata-se de tema que certamente causa polêmica. Deixamos claro, inicialmente, que nossa intenção não é incentivar a prática de direção sob efeito de álcool ou quaisquer outras substâncias, fator responsável pela morte de milhares de acidentes e mortes.

Todavia, devemos discutir as decisões judiciais proferidas, uma vez que estas possuem impacto profundo na sociedade. É a justiça – para alguns injustiça – do caso concreto.

A análise aqui desenvolvida baseia-se na leitura e interpretação do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro. Com efeito, dispõe o art. 306 do CTB:Art. 306.

Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência:

Penas – detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

§ 1o As condutas previstas no caput serão constatadas por:

I – concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou

II – sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora. [verificar Resolução 432/13 do Contran]

Pela leitura do dispositivo, fica claro que a simples ingestão de álcool ou outra substância psicoativa não é suficiente para a caracterização de crime, sendo requisito mínimo que haja alteração na capacidade psicomotora do indivíduo.

Vale a observação de que a concentração de álcool igual ou superior a seis decigramas de álcool por litro de sangue (ou 0,3 miligrama de álcool por litro de ar), com a alteração legislativa, não é mais parte do tipo penal, mas uma das formas de comprovação da sua ocorrência, sendo configurado também o crime pela identificação de sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora.

Logo, não basta a mera constatação de que há presença de álcool, necessitando, para que haja responsabilização criminal, a comprovação de que o condutor não possuía condições de dirigir.

Neste sentido já se pronunciou autorizada jurisprudência:

Ementa: APELAÇÕES CRIME. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA CONDENAÇÃO. RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO. A prova dos autos é insuficiente para a comprovação da alteração da capacidade psicomotora do réu. Há grande dúvida sobre o fato de o réu ter, ou não, ingerido bebida alcoólica e, mais ainda, acerca da alteração da capacidade psicomotora do réu. O policial militar responsável pela autuação da infração, que lavrou o termo de constatação de embriaguez, disse não recordar do fato em juízo. O registro dos sinais de alteração da fala e do comportamento do acusado assinalados no termo de constatação de embriaguez de fl. 07 não evidenciam, por si só, a alteração da capacidade psicomotora, principalmente quando a prova judicial não corrobora tais pontos. Sentença absolutória mantida. VIOLAÇÃO DA SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR VEÍCULO AUTOMOTOR. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. RECURSO DEFENSIVO DESPROVIDO. Interrogado, o acusado confessou que estava com a sua CNH suspensa na data do fato, assumindo, assim, a prática do delito. Trata-se de crime de mera conduta, prescindível a demonstração de perigo de dano pelo fato de dirigir com a habilitação suspensa. Inaplicabilidade do princípio da intervenção mínima do direito penal ao caso considerando a existência de lei específica que dispõe sobre a permissão do direito de dirigir. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO MINISTERIAL, POR MAIORIA. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DA DEFESA. UNÂNIME. (Apelação Crime Nº 70071976641, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rinez da Trindade, Julgado em 29/03/2017).


Apelação. Embriaguez ao volante. Alteração da capacidade psicomotora. Lei n. 12.760/12. Retroatividade. Com a alteração do artigo 306 da Lei 9503/97 pela Lei 12.760/12, foi inserida no tipo penal uma nova elementar normativa: a alteração da capacidade psicomotora. […] Assim, a adequação típica da conduta, agora, depende não apenas da constatação da embriaguez (seis dg de álcool por litro de sangue), mas, também, da comprovação da alteração da capacidade psicomotora pelos meios de prova admitidos em direito. Aplicação retroativa da Lei 12.760/12 ao caso concreto, pois mais benéfica ao réu. Ausência de provas da alteração da capacidade psicomotora, notadamente em razão do depoimento do policial responsável pela abordagem, que afirmou que o réu conduzia a motocicleta normalmente. Absolvição decretada” (TJRS, 3ª c. Crim. Rel. Nereu Giacomolli, j. 09/05/2013).

Importante salientar que, sem a perda de reflexo, mas verificados sinais de que o condutor utilizou álcool e afins, configurada a infração do art. 165 do CTB.

Fonte: Multas Zero.

 

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