A proposta de Ciro Gomes para limpar o nome dos brasileiros no SPC é viável?

Ciro Gomes, candidato do PDT à Presidência da República, parece ter definido sua principal promessa de campanha: limpar o nome de 63,4 milhões de brasileiros que estão inadimplentes no SPC (Serviço de Proteção ao Crédito).

O ex-governador do Ceará afirma que ter o nome sujo é uma “humilhação”. Para resolver o problema, propõe que bancos públicos e privados renegociem as dívidas dos consumidores, descontando juros sobre juros, multas e correção monetária. Tudo com a “mediação poderosa” do governo.

Ciro, porém, não detalhou a proposta, e os questionamentos enviados pelo HuffPost Brasil à campanha não foram respondidos. Nesta terça-feira (14), o candidato rebateu críticas de que a proposta seja “rasa” e, ao justificar a falta de informações sobre o plano, disse que seus adversários estariam copiando suas ideias, informa o MSN.

“Você acha mesmo que eu faria uma proposta que não tenha sido detalhadamente estudada? O problema é que meus adversários estão imitando tudo”, afirmou Ciro em evento da Unecs (União Nacional de Entidades do Comércio e Serviços), em Brasília. Ele disse apenas que, se for eleito, a renegociação só será permitida para dívidas contraídas até 20 de julho de 2018.

É uma proposta que certamente tem apelo eleitoral, mas, do ponto de vista macroeconômico, é uma medida de curto prazo e alcance limitado.Clemens Nunes, professor da FGV.

De acordo com o SPC, a dívida média do brasileiro é de R$ 1.512,48. Ciro tem dito que, descontados juros e outros “desaforos”, o valor passa para R$ 1.400.

“Aí eu pego o Banco do Brasil e a Caixa Econômica, tiro os juros de 486% [do cartão de crédito] e cobro 10%, 12%. Se os bancos privados se interessarem, eu dou uma afrouxadinha no compulsório [dinheiro que os bancos são obrigados a deixar parado no Banco Central]”, explica o candidato, em vídeo divulgado nas redes sociais.

Economistas ouvidos pelo HuffPost Brasil afirmam que buscar soluções para o endividamento das famílias é urgente, mas alertam para a complexidade do plano desenhado por Ciro.

“Pensando nos bancos públicos, é preciso separar Banco do Brasil e Caixa. No Banco do Brasil isso seria mais difícil, pois é uma empresa de capital aberto, e a obrigação legal do controlador [governo federal] é agir segundo os interesses dos acionistas”, afirma Clemens Nunes, professor da EESP FGV (Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas).

Para Filipe Pires, professor de finanças do Ibmec-RJ, medidas que possam reduzir a autonomia de órgãos como o Conselho Monetário Nacional (CMN), que regula o sistema financeiro brasileiro, tendem a ser vistas com “desconfiança” pelo mercado.

“Por mais que possa haver, e deve haver, uma conversa franca entre Planalto e Conselho Monetário, por exemplo, a autonomia gera credibilidade. Essas medidas podem trazer resultados no curto prazo, mas, no médio prazo, o mercado penaliza. Então é preciso avaliar se medidas que alteram ou reduzem a autonomia das autarquias que controlam a política monetária são capazes de gerar resultados permanentes”, diz Pires.

É preciso avaliar se medidas que reduzem a autonomia das autarquias que controlam a política monetária são capazes de gerar resultados permanentes.Filipe Pires, professor do Ibmec.

Inadimplência como ciclo vicioso

Os analistas entendem ainda que, se a ideia é estimular o consumo das famílias para aquecer a economia, gerando desenvolvimento, emprego e renda, limpar o nome dos endividados não basta.

“Se a economia continuar parada, o desemprego não cair e o consumidor não aumentar sua renda, ele vai se endividar novamente e cair nessa mesma situação de inadimplência”, avalia o professor Nunes. “É uma proposta que certamente tem um apelo eleitoral razoável, mas, do ponto de vista macroeconômico, é uma medida de curto prazo e alcance limitado”, completa.

Para Nunes, o País precisa buscar meios de resgatar a confiança dos investidores. “É importante dizer que é possível reativar a economia de diferentes maneiras. O Brasil precisa aumentar o seu nível de investimento, e isso produziria efeitos de longo prazo mais benéficos que o estímulo ao consumo”, diz.

O professor Filipe Pires lembra que as taxas de juros do rotativo do cartão de crédito no Brasil são as mais altas do mundo — de cerca de 400% ao ano — e afirma que a proposta de Ciro, embora de “extrema importância”, “não altera as regras do jogo”.

“Ele não citou nenhuma medida que possa alterar de forma permanente a estrutura que existe hoje, apesar de dizer que o modelo é absurdo”, afirma, para então fazer uma ressalva. “É claro que isso não é simples. A gente vem de uma conjuntura histórica de leniência em relação aos financiadores da política monetária do País e até pouco tempo atrás nós vivíamos uma realidade muito diferente da atual, de hiperinflação e endividamento externo”, pontua Pires.

15/08/2018

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